Andam mexendo no nosso queijo!

Por: Felipe Mello, Roberto Ravagnani
01 Março 2008 - 00h00

Em outras épocas, quando um animal habitava insistentemente o sonho de alguém, o sonhador acordava com uma tremenda vontade de fazer uma fezinha no jogo do bicho. Afinal, a mensagem onírica poderia ser um presságio da multiplicação dos pães sem muito esforço.

E o que fazer quando a gente insiste em enxergar comparações entre o comportamento de um animal e eventos de nosso cotidiano? Simplesmente creditar ao acaso ou buscar significados e mensagens? Há tempos os ratos vêm cruzando o caminho da sociedade brasileira. Afinal, onde há sujeira, há ratos. Sem ofensa ao pequeno roedor. O pobre nem faz parte da lista do jogo do bicho. E mais, nem cartão corporativo ele tem para fazer multiplicar a sujeira que o alimenta.

Se você não puder ser um pinheiro no topo da colina,
Seja um arbusto no vale – mas seja
O melhor arbusto à margem do regato:
Seja um ramo, se não puder ser uma árvore.

Mais de cem dias de solidão

Rato lembra queijo. E queijo lembra uma história recente, acontecida na terra do primeiro presidente eleito democraticamente após 25 anos de repressão militar. Sim, a esperança collorida. Menos cores tinha a cela alagoana onde ficou trancafiado por mais de quatro meses um homem de 27 anos, à espera de ser julgado. Seu crime? Furto de uma lata de leite e um pacote de queijo.

O ato não se justifica e merece punição. Assim como merece castigo, especialmente com o ostracismo político urgente, de quase toda esta geração de parlamentares que não consegue superar sua mediocridade paquidérmica e egoísta para desempacar a Reforma do Judiciário.

O deboche é tão escancarado que, enquanto um brasileiro espera ser julgado pelo furto de pequenos laticínios, os “companheiros” do Mensalão pagam sua dívida com a sociedade prestando pequenos serviços à comunidade. E mesmo com uma pena tão leve, Sílvio Pereira, um dos acusados, ainda se deu ao luxo de não aceitar a tarefa de fiscalizar a varrição de rua e a limpeza dos bueiros. Deve ser porque a especialidade deles é sujar, e não limpar o país.

No escuro da cela, um cidadão brasileiro aguarda seu julgamento, adquirindo problemas de pele por falta de banho de sol, em função da superlotação do distrito. Talvez as marcas em sua pele tenham se unido à cicatriz histórica de um sistema judicial falido, que reiteradas vezes provou que é mais fácil condenar quem já cumpre pena de vida.

Em pastos mais fartos, todavia, ratos mamam em tetas gordas, sob os auspícios de milhões de olhares complacentes, que tudo sabem e pouco fazem.

Se não puder ser um ramo, seja um
pouco de relva,
E dê alegria a algum caminho:
Se não puder ser almíscar, seja, então,
apenas uma tília –
Mas a tília mais viva do lago!

É de sonho e de pó o destino de um só

Quem nunca ouviu que sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade? A tonalidade escura dos primeiros parágrafos é reflexo da comichão por saber que o país patina sobre seu próprio potencial por falta de sonho coletivo. Melhor ainda quando prazos são colocados nos sonhos, que então se tornam metas. Diferente dos “Planos de Metas” esfregados em nossa face em períodos eleitorais.

O presidente dos trabalhadores nem mais cita na sua agenda atual a Reforma Trabalhista, embora tenha prometido como meta nas cinco eleições que disputou. Sonhos coletivos são diferentes. Metas coletivas são diferentes, porque podem se tornar realidade.

Um caminho foi sugerido por Martin Luther King, líder negro estadunidense ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1964. No discurso em que foi laureado, ele afirmou com toda a ênfase que lhe era peculiar que “mesmo que o ser humano tenha conquistado avanços espetaculares na ciência e tecnologia, e ainda conquistará mais, algo básico está faltando neste mundo. Existe um tipo de pobreza de espírito que se mantém em contraposição à abundância científica e tecnológica. Quanto mais ricos ficamos materialmente, mais pobres nos tornamos moral e espiritualmente. Nós aprendemos a voar no ar como pássaros e nadar no mar como peixes, mas ainda não aprendemos a simples arte de viver como irmãos”.

Não podemos ser todos capitães;
temos de ser tripulação.
Há alguma coisa para todos nós aqui.
Há grandes obras e outras, menores, a realizar,
E é a próxima a tarefa que devemos empreender.

Engarrafamento da justiça coletiva

No século 15, um autor chamado Etienne de La Boétie, amigo do filósofo Montaigne, escreveu o “Discurso da servidão voluntária”. No texto (aqui levemente adaptado, sem perda do sentido original), ele reflete sobre os motivos pelos quais um grupo de pessoas aceita se submeter “à pilhagem, às luxúrias, às crueldades, não de um exército, não de uma horda de bárbaros, mas, sim, de um pequeno grupo”.

O que explica o fato de tantos olhos verem os erros e poucos braços fazerem para mudar? Está certo que o país é jovem, que o processo de colonização foi estúpido e desordenado e que a nossa democracia é embrionária. Mas é fato que os brasileiros continuarão servindo voluntariamente às sucessivas gestões públicas incompetentes enquanto forem anódinos. E a anodinia acontece quando as pessoas deixam de se surpreender com as coisas belas e feias da vida. O espanto vai embora.

Fica a indiferença, que de tão poderosa cria uma situação em que, mesmo o brasileiro médio pagando 60% do que ganha na conta total dos impostos, ainda assim morrem por ano 50 mil cidadãos vítimas de homicídio; outros 40 mil morrem vítimas de acidentes de trânsito (grande parte por conta do péssimo estado de conservação e sinalização das vias públicas); 85% dos municípios ainda não oferecem tratamento de esgoto; as notas de matemática e compreensão de texto de nossos alunos são melhores apenas que a Tunísia, Catar e Quirquistão; 500 mil pessoas procuradas pela justiça encontram-se em liberdade por falta de capacidade da polícia; e apenas em 8% dos casos de homicídio alguém é indiciado, sendo que na Inglaterra este número é de 90%.

Se você não puder ser uma estrada,
seja apenas uma senda,
Se não puder ser Sol, seja uma estrela;
Não é pelo tamanho que terá êxito ou fracasso –
Mas seja o melhor do que quer que você seja!

Bom humor em tempos de cólera

Mesmos com todos os desafios e suspiros lamuriosos apresentados nestas linhas, existe a crença de que o povo brasileiro guarda potência transformadora em si. É só por isso que vale a pena escancarar os problemas, pois há matéria-prima para soluções. Os ares tropicais, a mistura de raças e culturas, as belezas naturais, enfim, diversos ingredientes parecem proteger o brasileiro normal da maior doença do século, a depressão. Ela já afeta 340 milhões de pessoas em todo o mundo e leva, anualmente, a 800 mil casos de suicídio.

Na Suécia, por exemplo, há mais suicídios que homicídios. Mesmo com tanto remédio, o número de pessoas que sofrem de depressão dobrou nos últimos 50 anos. Recentemente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificou a depressão como uma das doenças que mais causam incapacidade. É a quarta numa lista de cinco, e até 2020 terá ocupado o segundo posto.

Neste ranking, o Brasil felizmente está bem longe dos primeiros colocados. Oxalá permaneça por lá, conservando na média dos brasileiros uma fonte saudável de felicidade. Isto não significa, nem de longe, que não há depressivos em nosso país. Eles existem em grande quantidade, principalmente entre aqueles que acreditam que a velocidade seja mais importante do que a direção, e que ter e parecer sejam mais importantes do que pensar, fazer e agradecer.

O periódico norte-americano The New York Times apresentou em artigo recente a tese de um livro que afirma que a diversão e o bom humor geram muito lucro para quem neles investem. Resta aos brasileiros a oportunidade valiosa de se alimentar de sua alegria natural para se colocar em movimento contra a indiferença. Uma maneira de sair da inércia é distribuir gentileza e gratidão a todo instante, sem expectativas, pelo simples desejo de curar o mundo.

Outra é diminuir drasticamente a tolerância perante as pequenas injustiças do dia-a-dia. Afinal, quando alguém é testemunha de um ato injusto e nada faz, além de morrer um pouco naquele instante, prejudica a multiplicação da energia positiva, única ratoeira capaz de deter a fome dos sujos ratos que mexem em nosso queijo, adiando a sua correta distribuição.

A poesia espalhada pelo texto é de Douglas Malloch. Que estas mensagens se espalhem também dentro de nós, explodindo em ações gentis e promotoras de justiça.

Felipe Mello. Radialista, palestrante e diretor da ONG Canto Cidadão, fundada para produzir e democratizar informações sobre cidadania e direitos humanos.

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