Vitóriado meio ambiente

Por: Felipe Mello, Roberto Ravagnani
01 Novembro 2003 - 00h00
Organização social aposta na criação de Ecopontos e no envolvimento da comunidade local para a solução das questões relacionadas ao lixo

Há alguns meses uma notícia chamou a atenção daqueles que se interessam pelas questões relacionadas à natureza. A pauta informava que “São Paulo já tem um bairro ecológico”. Como esse tema não deve ficar restrito somente àqueles que já se interessam pela ecologia – sob pena de não revertermos o atual quadro de degradação ambiental –, é preciso traduzir para uma linguagem acessível o convite ao exercício pleno da cidadania a um número cada vez maior de personagens indispensáveis, os cidadãos.

Sócrates, ainda na Grécia Antiga, dizia que cidadão é aquele que cuida da sua cidade. Simplesmente isso, ao mesmo tempo, complexo como isso. O bairro “ecológico” em questão é o Parque Vitória, localizado no distrito do Tremembé, zona norte da capital paulista. Trata-se do primeiro bairro da cidade onde, muito em breve, haverá coleta seletiva de lixo em todas as 70 ruas.

A criação do primeiro Ecoponto

Uma vez que os gregos antigos já foram convidados para fortalecer a argumentação, pode-se agregar ainda mais valor a ela com um antigo provérbio chinês: se você quer uma cidade limpa, você pode ajudar muito varrendo a porta da sua casa. É exatamente com tal espírito que os moradores do Parque Vitória vêm transformando a realidade do local. Isso porque a organização da coleta seletiva de lixo é feita pela comunidade, que recolhe e separa o material, vendendo-o para a reciclagem e aplicando o lucro obtido na cooperativa gerenciadora da operação. A ação está centrada naquilo que é chamado de Ecoponto – um galpão construído em um terreno de 1.200 metros quadrados cedido por um morador, para onde o lixo é levado e separado. No entanto, a estrutura em questão não foi fruto de geração espontânea: um grupo de pessoas organizadas em torno de uma causa gerenciou e continua gerenciando a atividade.

A coordenação do projeto é feita atualmente pela organização-não governamental Ecos do Vitória, criada como seqüência natural do Projeto Vitória, que começou há mais de três anos o programa de coleta seletiva já citado. Em função do sucesso da iniciativa, alguns integrantes se uniram a outros profissionais do Terceiro Setor, como a ecóloga Elaine Silva, atual presidente da entidade, para se dedicarem à gestão ambiental. Assim, como o próprio nome diz, Ecos do Vitória – Educação e Gestão Ambiental, os conceitos fundamentados passaram a ecoar de diversas formas, baseando-se na relação biológica célula-núcleo para sedimentar a filosofia do trabalho. A grande motivação foi levar para as comunidades a visão da cidade como um organismo vivo: cada bairro sendo uma célula; os rios como veias; a vegetação equivalente aos pulmões; o centro sendo o coração e tantas outras relações que podem ser definidas, precisando todas serem bem cuidadas.

Espalhando o conceito

Romilda Haddad, coordenadora de relações institucionais da entidade, lembra que “o Projeto Vitória já chamava de Ecoponto o núcleo que administrava a coleta seletiva da célula Parque Vitória”. E foi para multiplicar tal formato que a Ecos nasceu, acreditando que a cidade não resolverá o problema do lixo se cada bairro não tiver responsabilidade sobre a própria produção diária e encaminhamento. Para cumprir essa missão, a instituição tem desenvolvido diversas atividades a fim de promover, estimular e facilitar a gestão ambiental nas microrregiões a partir do gerenciamento de resíduos no modelo cooperativista, aliando educação, conservação ambiental e geração de trabalho e renda. Uma fórmula que deu certo em um bairro e que, segundo a coordenadora, pode ser perfeitamente aplicada em outras regiões da cidade.

Buscando auxiliar no processo de adaptação desse formato em outros locais, a Ecos do Vitória oferece curso gratuito sobre o tema para lideranças comunitárias. O objetivo é capacitar os participantes a constituir unidades de gerenciamento comunitário de educação ambiental e coleta seletiva. O curso é mensal e conta com o apoio de uma universidade da região. Ainda no sentido de democratizar informações, Romilda informa que a or­ganização “tem abastecido todos os grupos que a procuram e tentado colaborar com contatos e parcerias para que possam criar os próprios Ecopontos.

Os eventos também fazem parte da estratégia para lançar novas campanhas. Um exemplo é o Projeto Rio da Nossa Aldeia, lançado em setembro, que nos próximos dois anos irá colaborar para a despoluição dos rios Mazzei, Tremembé e Cabuçu, que deságuam no Tietê. Tal programa está acoplado ao Projeto Tietê, que foi desenvolvido pela Sabesp e conta com a SOS Mata Atlântica cuidando da Educação Ambiental. Além disso, a Ecos do Vitória participa de ações com o Núcleo Regional de Educação Ambiental da Zona Norte (NEAN) e, em dezembro de 2002, iniciou as atividades com a construtora Gafisa, tentando viabilizar a reciclagem de entulho gerado nas obras.

Geração e captação de recursos

A busca pela sustentabilidade das ações é uma pré-condição para o sucesso do Terceiro Setor. A Ecos do Vitória traz esse referencial em suas obras, tanto que existem atualmente 15 postos de trabalhos somente no Parque Vitória, gerados sem nenhum fundo inicial a não ser a venda dos resíduos. Romilda faz uma reflexão quando lembra que “em São Paulo são aterrados mais de R$ 2 milhões que poderiam amenizar a miséria, caso houvesse maior investimento em educação sobre matérias-primas e boa administração do lixo pelas cooperativas de cada bairro”. Fora a criação de empregos e renda por meio das atividades de re­ciclagem, há procura por outras fontes de recursos que venham a ampliar e fortalecer os projetos. A organização tem apresentado programas e concorrido a prêmios, sendo que já foi contemplada neste ano com os prêmios Brazilfoundation e o Formatos 500 do Senac, em parceria com o Consulado Americano. Tais verbas, assim como os patrocínios do Projeto Rio da Nossa Aldeia e a colaboração de novos apoiadores que estão sendo prospectados, serão responsáveis pela sustentabilidade das obras do próximo ano.

O voluntariado e os resultados conquistados

A ação voluntária fez parte do início do Projeto Vitória. Em 2000, após curso ministrado pela SERT (Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho), 18 pessoas incubaram projeto para educar, coletar e vender resíduos, originando desse modo o primeiro capital da cooperativa e o trabalho. Durante praticamente dois anos, elas receberam apenas ajuda de custo. Tal empreendedorismo e voluntariado foram decisivos para a criação da organização Ecos do Vitória. O resultado é percebido hoje, uma vez que mais de 100 comunidades já receberam os conhecimentos gerados pelo grupo. Segundo Romilda Haddad, “somente no curso já formamos mais de 60 agentes multiplicadores, pois as primeiras turmas tinham seis alunos e, desde outubro, são 25 por turma”. Para dar credibilidade às ações, a entidade pretende publicar seu balanço a partir deste ano, já que foi constituída legalmente em dezembro de 2002.

O sucesso do primeiro bairro eco­lógico de São Paulo comprova que a sociedade civil organizada é capaz de transformar o próprio bairro em local limpo, desde que o convite seja feito da forma correta e por pessoas capacitadas, como no caso do Parque Vitória.

Os números da Ecos

- 15 postos de trabalho só no Parque Vitória

- 100 comunidades já receberam os conhecimentos gerados pelo grupo

- 60 agentes multiplicadores formados

- 25 participantes por turma atualmente no curso mensal

- 150 toneladas de lixo são reciclados por ano no Parque Vitória

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