A remuneração do empregado-dirigente do ente social e o risco fiscal

Por: Marcos Biasioli
01 Julho 2011 - 00h00
Recentemente, recebemos a seguinte consulta: “Representamos uma entidade social e, como não tínhamos voluntários dispostos a assumir a direção, convidamos alguns empregados mais antigos, que a assumiram. No entanto, eles continuam trabalhando na instituição como antes, e recebendo igual remuneração. Para nossa surpresa, a prefeitura de São Paulo nos comunicou que, em face de remunerarmos dirigentes, perdemos a isenção dos tributos do município. O que fazer agora? Não temos dirigentes voluntários para nosso projeto e precisamos dos recursos das isenções fiscais, pois colocamos tais recursos nos próprios projetos que beneficiam milhares de pessoas carentes.
A problemática não é sui generis, pois muitas instituições passam por situação similar, uma vez que não é difícil encontrar pessoas para atuar como voluntárias na obra do bem, porém, é cada vez mais difícil encontrar voluntários que se disponham a trabalhar graciosamente em prol de uma instituição social na condição de dirigente; que tenham disponibilidade em horário comercial; e respondam, inclusive, com seu próprio patrimônio em favor da defesa dos interesses sociais da obra.
Diante deste cenário, pode-se afirmar que a decisão da consulente em eleger os próprios empregados para o cargo diretivo não deixa de ser uma medida assertiva, pois o empregado conhece a operação e seus problemas, bem como seus limites orçamentários, e sabe que se não produzir e trabalhar com afinco seu próprio emprego estará sob risco.
Ocorre que algumas correntes dissertam que, muito embora a medida seja prática e legal, nem sempre ela será ética, pois como pode um dirigente deliberar sobre seu próprio salário e benefícios, entre outros, sem ferir os interesses da entidade? Enfim, encontra-se uma saída para o órgão diretivo, porém se emboca noutras discussões, como a ética e a fiscal, esta ante ao fato de o Código Tributário Nacional vedar a distribuição a qualquer título para dirigente partindo de uma instituição social enquadrada como imune a tributos.
Para se dissuadir o impasse, há necessidade de se separar sustentabilidade econômica do ente social e a remuneração dos dirigentes. Iniciando pelo primeiro, é preciso focar nos anseios da iniciativa social, ou, melhor dizendo, se os idealizadores/gestores da obra social tiverem o anseio de firmar parceria com o Estado no sentido de complementar sua missão na busca da erradicação das desigualdades, podem participar do orçamento público em tal empreitada, quer seja de modo direto, recebendo repasses econômicos, ou de modo indireto, por meio da isenção e/ou imunidade tributária.
Neste caso, transparência e lisura serão módicas, pois se estará administrando um recurso público que gravita dentro da iniciativa privada e, assim sendo, todo vintém que sair do bolso da instituição, ora derivado do repasse, sairá dos cofres do Estado, e é por isso que a lei veda a distribuição a qualquer título de bens ou recursos aos dirigentes.
A caminhada pela sustentabilidade dos entes sociais pode estar dissociada dos recursos públicos; os gestores podem optar por buscar recursos de outras fontes, como aquelas da iniciativa privada e, assim, estão isentos da regra que impede a remuneração de dirigentes, porém, é recomendado que adequem seus estatutos para buscarem o reconhecimento de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) junto ao Ministério da Justiça, no qual faculta a possibilidade de se remunerar dirigente.
As Oscips também poderão desenvolver parcerias com o Estado e, ao mesmo tempo, remunerar dirigentes; aliás, esta é a principal função delas, porém, lhes são vedados os recursos derivados da renúncia fiscal, eis que são reservados para entidades de educação e assistência social, reconhecidas como entidades beneficentes de assistência social.
Neste contexto, as entidades sociais que seguirem esse caminho estarão completamente alinhadas com a legislação e raramente serão questionadas pelo órgão público por estarem remunerando dirigentes, pois o ato é legal e não fere qualquer princípio de transparência social.
De outro lado, as entidades beneficentes de assistência social, reconhecidas por um dos ministérios (MEC, MDS ou MS), são instituições isentas e imunes de recolhimento de tributos e, assim, estão impedidas de remunerar dirigentes, pela função de dirigentes, sob pena de violarem o CTN, pois a previsão legal proíbe a distribuição de patrimônio e/ou renda a qualquer título. A consequência de tal ato será a obrigatoriedade de devolver ao Fisco todos os recursos, ora frutos do tributo, que deixaram de recolher aos cofres públicos.
Muito embora a lei não deixe margem a qualquer outra interpretação, pode-se afirmar que, seguindo o exemplo da consulente, não há qualquer vedação em se incluir no quadro diretivo empregados da instituição social nem o dever deles de se demitirem, ante a cumulatividade de funções. A dualidade de papéis pode não ser ética, mas não é ilegal, e a remuneração deles, na condição de empregados, não fere a vedação do CTN, a uma, que continuarão a receber pela função empregatícia que sempre tiveram; e a duas, ante ao fato de que a remuneração na qualidade de empregado é diametralmente contrária à distribuição de renda disfarçada à dirigente, exceto se cessar o trabalho primitivo em prol do status de dirigente.
Assim, caso a administração pública resolva tributar o ente social isento/imune, sob o argumento de que a remuneração do empregado que cumula função de dirigente em instituição social viola a lei, ela estará cometendo um ledo engano e estará, por consequência, violando o artigo 5°, inciso XIII, da Constituição, que aduz: “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer”. Ou seja, estará retirando do obreiro do Terceiro Setor a liberdade constitucional do exercício do trabalho.
A Receita Federal, por meio da Instrução Normativa nº 113/98, prevê em seu artigo 4º: “Para gozo da imunidade, as instituições imunes de que trata o art. 1° não podem remunerar (...) seus dirigentes pelos serviços prestados. (...) § 2° Não se considera dirigente a pessoa física que exerça função ou cargo de gerência ou de chefia interna na pessoa jurídica. (...) § 4° Às pessoas a que se refere o § 2° podem ser atribuídas remunerações, tanto em relação à função ou cargo de gerência, quanto a outros serviços prestados à instituição”.
O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, no acórdão n° 107-07340, também tem decidido acerca da possibilidade de se remunerar empregado que simultaneamente atua como dirigente: “Ementa: As mantenedoras de estabelecimentos de ensino podem ter a imunidade tributária suspensa nos termos do artigo 14, par. 1° do Código Tributário Nacional. Porém, o pagamento regular de salários e outras rubricas trabalhistas, em retribuição de serviços prestados ao estabelecimento mantido, não caracteriza, por si só, desobediência à norma legal, exceto quando a fiscalização provar que a situação assim apresentada configura distribuição simulada de resultados”.
Enfim, negar que um profissional, principalmente um assistente social, que milite dentro de uma instituição social, na qualidade de empregado e/ou prestador de serviços, está impedido de se eleger1 a cargos eletivos, sob pena de se caracterizar, por parte da instituição social, uma violação à lei tributária e, por consequência, se ceifar um direito constitucional da imunidade tributária, implica em violar a Constituição Federal, que protege o direito ao livre exercício do trabalho e da isonomia.
Desta forma, conclui-se que o poder tributante deve ter a sensibilidade de antes de defender a sanha arrecadatória, ter o bom senso de analisar com bastante frequência não a remuneração do dirigente, mas o desvio de sua finalidade, uma vez que ele é quem caracteriza a evasão do dinheiro público, pois, do contrário, as instituições ficarão à deriva, pois nenhum voluntário estará disposto a virar alvo da sabatina fiscal, somente pela contrapartida espiritual.

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